(A cena mais simbólica do livro é apenas um relato no cinema)


A história real que inspira o filme é fantástica por si só: Imigrantes japoneses, privados de provas concretas, desacreditam na derrota japonesa que encerrou a Segunda Guerra Mundial e pegam em armas para combater, não os inimigos Aliados, mas os próprios conterrâneos que são considerados traidores por acreditarem na verdade.

E no livro de Fernando Moraes, a caça a esses “corações sujos” é ilustrada em episódios envolvendo katanas, harakiri, mantras budistas anunciando condenações e judocas espancando ruas inteiras.

O diretor Vicente Amorim, no entanto, escolhe uma abordagem mais subjetiva e foca a narrativa em um personagem (real em nome, fictício em essência???) apenas, o fotógrafo Takahashi.

Pacato, ele vive de sua profissão em uma São Paulo de interior, mas sem nunca se sentir em casa, mantendo em si o orgulho de sua pátria, como quando tira fotos de brasileiros com temas tropicais, mas quando fazendo questão de manter ao fundo o monte Fuji quando o cliente é japonês.

E seguimos sua jornada, de simples profissional, amigo da pequena xxx, para um assassino atormentado pelo conflito entre missão e consequências.

Uma escolha artística defensável. Mas há três pontos nela que questiono:


1- Somos privados de todo aquele cenário fantástico que sabíamos existir. E algo que poderia ser épico, tem um potencial desperdiçado e sabemos que não haverá oportunidade iminente de revisitarmos esse universo nesse emaranhado que é a produção cinematográfica nacional.

2- Os outros personagens propostos no filme, interessantes, também são pouco explorados dramaticamente.

3- O herói é posto como herói. Com direito a toda jornada até a redenção. Ele é o único simpático. Ele tem uma amiga criança. Ele é o único que sente culpa. Ele é manipulado por colegas insensíveis e superiores vilanescos com más intenções.


Sem compromisso com o factual ou com a complexidade, o diretor então se sente livre para narrar essa queda psicológica do protagonista (e, em parte, de sua esposa). Para isso, usa sequências subjetivas (Takahashi caminhando nos campos de algodão, sua esposa sendo corroída pela dor da culpa junto ao galinheiro) e planos belíssimos (os sete andando em direção à delegacia, o contador morto em um bolo de algodão com o sangue formando a bandeira japonesa). Mas, se por um lado as sequências são esteticamente admiráveis, por outro elas não funcionam como elementos narrativos que mostrem conteúdo para a trama. A mesma lógica vale para a trilha sonora, que pontua os momentos chave, mas não cria uma identidade.


Nota: 7/10


Um dos trailers


E o site, que tá bem bonito =)http://www.coracoessujos.com.br/
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Comentários
15 de dezembro de 2012 às 12:40
Anônimo :

Bela crítica Doraemon, você fugiu do corporativismo oriental e teve coragem de fazer uma análise verdadeira sobre um filme que deveria contar a história de um povo do qual você faz parte até hoje.

Aliás, o filme de épico não tem nada mesmo. O filme inclusive seria melhor se o diretor se filmasse durante 2 horas lendo os principais trechos do livro em voz alta e pausadamente.

O filme não é ruim, mas ele se torna deprimente se comparado com o livro que ele tenta adaptar. Todas as simbologias melancólicas e histórias ficcionais que deram fundo a esse filme apenas desviaram o foco da magnífica história real que é tratada no livro. O filme que deveria ser sobre a história dos nipo-brasileiros virou uma ode à abitolação e à culpa.

Todas as cenas paradas e subjetivas que o diretor jogou no filme só ajudaram a colocar um recheio amargo num filme que já estava chato e lento. Para mim o verdadeiro coração sujo no final das contas foi o diretor, que jogou literalmente no lixo uma história oscarizável para criar uma trama tediosa que ninguém gostou de verdade. A direção ainda tentou emular vergonhosamente os 4 atos de um filme japonês- o que deixou o meu sofrimento ainda mais longo.


O diretor quis inventar demais e acabou colocando pouco do livro nesse filme. Por isso existe pouco de bom nessa produção. Os detalhes maravilhosos do livro não passam de detalhes a serem despercebidos no meio de tudo que acontece no filme.

No final da história o personagem do Eduardo Moscovis não passa de uma analogia do que é um brasileiro assistindo a esse filme: um homem que não entende nada do que está acontecendo do início ao fim. Espero que algum dia algum historiador corajoso possa adaptar essa história épica para um mangá ou um anime.

Eu sai do cinema pensando que se eu fizesse uma fanfic baseada no livro poderia contar uma história melhor e mais curta do que a contada nesse filme. Até porque já li fanfics muito melhores do que esse filme.

Essa produção não se limita apenas em ser um desperdício de dinheiro, mas infelizmente despediça também uma história que dificilmente será contada algum dia nas telas do cinemas com a qualidade que merece.

Se o filme tem uma coisa boa é o trailer, pois o trailer conseguiu me enganar completamente e me deu todas as falsas esperanças de que esse ele seria emocionante e histórico. Todas as cenas do trailer são muito bem filmadas e criam imagens que podem perfeitamente servir de reforço visual para os leitores do livro.

Mais um livro excelente virou inspiração para um filme medíocre. Graças à mais uma péssima adaptação, Corações Sujos não fez sucesso nas bilheterias do cinema, mas agora podemos torcer que o filme tenha mais sucesso nas barracas de camelô.

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